Parecer sobre a nova reforma dá previdência elaborado pelos advogados dá FENASSOJAF

EMENTA: PEC 287/16 | Regras alteradas | Inconstitucionalidades e meios de
impugnação | Proposta que viola o direito – em exercício – a regras de transição,
o ato jurídico perfeito, a vedação ao retrocesso social, o caráter contributivo e a
exigência de fundamentação atuarial | Calendário de tramitação | Quadro
comparativo

A Constituição da República Federativa do Brasil foi promulgada em
1988. De lá para cá, o Regime Primages (18)óprio de Previdência do Servidor Público (RPPS)
previsto em seu artigo 40 foi modificado seis vezes. A primeira mudança veio pela
Emenda Constitucional nº 3, de 1993, enquanto as reformas mais importantes foram
as mediadas pelas Emendas Constitucionais nº 20 e nº 41.
Não suficiente, a Proposta de Emenda Constitucional nº 287,
protocolada em 5 de dezembro de 2016, pretende realizar a modificação mais radical
até aqui idealizada. Mais que uma reforma, estabelece uma nova previdência para
servidores. O que a substituirá, no futuro, é algo que somente a certeza sobre o tipo
de Estado que se deseja responderá.
As sucessivas alterações previdenciárias refletem algo mais grave,
ligado ao retrocesso de institutos incorporados ao Estado de Direito, no decorrer da
matriz liberal-social-democrática que sucedeu ao absolutismo monárquico. No caso
brasileiro, a Constituição andou mais rápida que a realidade, retrocedendo antes de
concretizar seus desejos originais.
Em paralelo, as apostas econômicas dominantes se recusam a
dialogar com alternativas para que a vida de todos melhore, conduta turbinada pela
apatia das ideologias de esquerda, supostamente aniquiladas pela queda de
determinados Estados e o consequente fim da História.
O resultado da redução gradativa dos institutos sociais do Estado de
Direito é sensível, ameaçando a previdência, o trabalho e a sobrevivência daqueles
que não alcançarem os requisitos exigidos, progressivamente mais difíceis de serem
atingidos.
Em 1988, o tempo de serviço se sobrepunha à exigência de idade
mínima no serviço público, até então desnecessária. Incluída a idade mínima de 60
anos para o homem e 55 anos de idade para a mulher, passou-se a se exigir também
o tempo de contribuição de 35 e 30 anos, respectivamente, tudo a partir da EC nº 20,
de 1998. Na oportunidade, aos servidores que estavam no regime foram exigidos
pedágios para manterem aposentadorias e pensões na forma proporcional ou integral.

Ao futuro, permitiu-se a criação da previdência complementar.
Cinco anos depois, a EC nº 41, de 2003, alterou os critérios de
cálculo das aposentadorias e das pensões, com graves prejuízos, como a perda da
paridade e o cálculo pela média remuneratória. Aos trabalhadores antigos foram
criadas regras de transição com acréscimo de requisitos distribuídos entre idade
mínima, tempo de contribuição e carências no serviço público, na carreira e no cargo,
para a manutenção de algumas garantias. Aos novos, que ingressaram após a
instituição do regime complementar sobrevindo em 2013, o teto de benefício passou
a ser o mesmo do Regime Geral de Previdência Social.
Diante de algumas arestas, em 2005, 2012 e 2015 foram realizadas
alterações pontuais, seguidas pelas constantes reclamações dos governos e dos meios
de comunicação de massa, sincronizadas sobre o suposto déficit previdenciário
(matéria de muitas divergências e abordagens que apresentam superávit pela
seguridade), em nítida preferência aos planos privados de benefício, administrados
por instituições financeiras que – há tempos – desejam tais investimentos.
Não por acaso, os noticiários atuais dedicam longo tempo à
propaganda e orientação sobre a escolha entre múltiplos produtos de seguridade
social, ofertados pelos bancos. Trata-se da migração do regime de repartição para o
de capitalização; migração parcial, por enquanto.
A evidência de que se deseja uma solução menos social à previdência
veio com a PEC 287, que afeta todos os servidores, estabelecendo nova transição
apenas aos trabalhadores com idade igual ou superior 50 (homens) e 45 (mulheres)
anos.
Se aprovada a proposta, o que se conhece por requisitos e critérios
para aposentadorias e pensões será alterado. A idade mínima para homens e mulheres
passará a 65 anos, o tempo de contribuição mínimo é alterado para 25 anos e o
patamar inicial dos proventos da aposentadoria será de 51% da média da remuneração
contributiva, acrescido de 1% por ano considerado no cálculo. Aqui, um servidor com
65 anos de idade e 35 anos de contribuição receberá 86% (51 + 35) da média,
enquanto uma servidora com 65 anos de idade e 30 anos de contribuição receberá
81% (51 + 30) da média. Requisitos de idade e tempo foram equiparados em suas
consequências para homens e mulheres, o que significa que ambos precisam trabalhar
49 anos (recolhendo contribuição previdenciária) se desejarem 100% da média
remuneratória. Para fecharem 49 anos de contribuição aos 65 anos de idade, devem
começar aos 16 anos.
As regras de transição anteriores serão extintas. Os servidores
estarão sujeitos às novas regras, salvo aqueles que se aposentaram ou preencheram
os requisitos para tanto antes da publicação da nova emenda. Os servidores com idade

gual ou superior a 50 (homem) e 45 (mulher) anos serão submetidos a uma nova
transição que exige 50% a mais de tempo contributivo. A esse grupo, somente aqueles
que ingressaram até 31/12/2003 ainda teriam alguma possibilidade de manter
paridade e integralidade (sem média), desde que trabalhem 50% a mais do que faltar
para o tempo de contribuição de 35 (homem) e 30 (mulher) anos e atinjam,
respectivamente, 60 e 55 anos de idade, além de carências no serviço público, na
carreira e no cargo.
Em até dois anos, os entes federativos devem instituir seus regimes
complementares, a exemplo do que foi feito em 2013 pela União, para que os
servidores dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios sejam submetidos,
indistintamente, ao teto de benefício do RGPS (administrado pelo INSS). O regime
de capitalização da previdência complementar é de contribuição (não de benefício)
definida. Investe-se no mercado financeiro, realimentando o que resta de esperança
no modelo econômico vigente, sujeito a ciclos de recessão indesejáveis e reiterados,
com pequenos intervalos entre um e outro. Na capitalização, sabe-se o valor da
contribuição, mas não se sabe qual será seu resultado.
Aos pensionistas, aplicar-se-á a regra da metade (cota familiar) mais
10% por dependente, limitada ao valor da aposentadoria a que o servidor teve ou teria
direito. Em outras palavras: na morte do instituidor da pensão, o cônjuge recebe 60%
(50% de quota mínima, mais 10% na condição de dependente) do que teria direito o
servidor e se tiver filhos na condição de dependentes, cada um recebe 10% até que se
tornem maiores. O total, como se disse, não pode ultrapassar 100% da média.
As aposentadorias especiais dos policiais (atividade de risco), das
pessoas com deficiência e daqueles beneficiados pela Súmula Vinculante nº 33 do
Supremo Tribunal Federal serão modificadas, submetendo seus destinatários a regras
bem menos interessantes. No exemplo do policial, permite-se que se aposente com
redução de até 10 anos no requisito de idade (55 anos) e redução de até 5 anos no
tempo de contribuição (20 anos). No entanto, o cálculo será de 51% da média
remuneratória (sem paridade), acrescida de 1% por ano de contribuição. Nessa
hipótese, os proventos de aposentadoria seriam reduzidos a 71% da média, algo bem
inferior ao que pensavam representar a aposentadoria especial na sistemática da Lei
Complementar 51, de 1985. A ausência de paridade significa que os proventos da
aposentadoria não serão reajustados na mesma proporção dos servidores em
atividade, seguindo a mesma sistemática de correção dos benefícios do RGPS,
administrados pelo INSS. Nessas condições, a aposentadoria especial se torna
inviável.
A aposentadoria por invalidez deixa de existir e, em seu lugar, o
artigo 40 da Constituição passará a prever a aposentadoria por incapacidade
permanente para o trabalho (que não admita readaptação), garantindo 100% da média
remuneratória somente no caso de acidente de serviço. Nos demais casos, vale a regra

de 51% da média, mais 1% por ano contributivo. Justamente por isso, a compulsória
aos 75 anos de idade foi remodelada para pior. A aposentadoria por idade foi extinta.
Há vários aspectos de aparente, senão evidente,
inconstitucionalidade na proposta. Em primeiro lugar, viola-se o direito a regras de
transição específicas trazidas pelas Emendas 41 e 47, com destinatários
determinados, que iniciaram o exercício do direito no momento da publicação das
emendas. Não foram regras gerais, mas de proteção específica que incidiram sobre
todos os que ingressaram até 31/12/2003 (sem contar a dupla proteção aos que
ingressaram até 16/12/1998). A transição estabelecida não conferiu expectativa, mas
exercício imediato de direito que não pode ser alterado 13 anos depois, sob pena de
violação ao artigo 5º, XXXVI, da Constituição.
A vedação ao retrocesso social, princípio de particular importância
nos direitos previdenciários, foi abandonado, como se nada representasse. O ato
jurídico perfeito constituído para os servidores que preencheram o requisito exigido
pelo “contrato” constitucional (o Estado garante, desde que), ou seja, terem
ingressado até 31/12/2003, é conjugado com o direito adquirido e ambos têm a
proteção constitucional, não podendo ser alterados.
Para piorar, o desrespeito ao caráter contributivo do regime
(consequentemente, retributivo) se une à ausência de demonstração atuarial
incontroversa da necessidade das mudanças, convergindo para o confisco tributário e
remuneratório dos servidores públicos.
Há muitos argumentos que podem ser levantados contra a PEC 287,
essenciais à segurança jurídica. Se, em nome de flutuações econômicas (ou
pretensamente econômicas), tudo é possível, desestruturam-se os elementos que
conferem legitimidade às instituições e conformam a cidadania. O risco de ruptura
não é apenas do serviço público, mas do Estado que se acredita democrático e de
direito.
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